quinta-feira, 6 de março de 2014

sobre finais e cantorias

Sabe quando o livro acaba sem continuação?
Ou melhor: sabe quando você já está nas últimas páginas do livro e sabe que a história acabará de forma incompleta? Quando você sabe que não importa o quanto venha a seguir, quantos eventos acumulados, mortes inesperadas e avalanches de realização. Que de uma forma ou de outra a história estará inacabada.

Ou não. Talvez o final da história seja a ausência dele.

Mas, é isso: me sinto nas últimas páginas de uma história, sabendo que o fim não será suficiente. E me encontro agonizando entre a contradição dos meus oitos e dos meus oitentas.

Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, do tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.

Drummond de Andrade

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