terça-feira, 27 de maio de 2014

haicai

"Me desculpe por não ser uma pessoa feliz. Eu só quero que isso acabe logo e que nós partamos.", foi o que ele me disse quando veio me dar boa noite. E eu não hesitei em relacionar o que ele sentia com o que sinto há algum tempo.

Talvez eu devesse estar aos prantos, desejando ficar; como ela o fez naquela nossa caminhada de volta a Susac, um pouco embriagadas.

Para que la realidad no sea irreal, nos dicen los que mandan, la moral ha de ser inmoral.

Enquanto nos alinhamos em fileiras no palco, para receber nossos certificados, que nos são entregados por uma mulher que eu nunca vi na vida. Em algumas horas, essa será a realidad. 

Assim, pois, o que parecia vontade imperiosa reduzia-se a veleidade pura, e, com algumas horas de intervalo, todos os maus pensamenos se recolheram às suas alcovas. Se me perguntardes por algum remorso de Sofia, não sei que vos diga. Há uma escala de ressentimento e de reprovação. Não é só nas ações que a consciência passa gradualmente da novidade ao costume, e do temor à indiferença. Os simples pecados de pensamento são sujeitos a essa mesma alteração, e o uso de cuidar nas coisas afeiçoa tanto a elas, - que, afinal, o espírito não as estranha, nem as repele. E nestes casos há refúgio moral na isenção exterior, que é, por outros termos mais explicativos, o corpo sem mácula.

Enquanto me transformo em personagem de uma história inventada por Machado de Assis ou criada por fases lunares e pedaços de pano: tanto faz, tanto fez. Agora já foi. 

O senhor é escritor, tem, como disse há pouco, obrigação de conhecer as palavras, portanto sabe que os adjectivos não nos servem de nada, se uma pessoa mata outra, por exemplo, seria melhor enunciá-lo assim, simplesmente, e confiar que o horror do acto, só por si, fosse tão chocante que nos dispensasse de dizer que foi horrível, Quer dizer que temos palavras a mais, Quero dizer que temos sentimentos a menos,

E Saramago era sábio, como sabemos. De que nos servem adjetivos? De que nos serve nos enfeitarmos, colorirmos, fingirmos esse sorriso no rosto? De que nos adianta forçar os 'últimos'? Forçar o existente acabado? Ou talvez percamos sentimentos por não expressá-los e acumulá-los em nós. 

De que serve tanta angústia e tanto lenga-lenga. Chega. Basta.

Queres que eu escreva sobre o aperto de me formar, de deixar Mostar, de deixar meus amigos? Sinto em decepcioná-los: não o farei. Porque aproveitei esses anos, me darei o prazer de não os lamentar com lágrimas de saudade precipitada. 

É bom o sentimento de estar pronta para partir. Estoy en otra canción, se acabo.

sábado, 24 de maio de 2014

xarope e tylolhot

Como já foi dito anteriormente, não sou capaz de concretizar finais em palavras. Talvez porque meus pensamentos nunca encontrem esses finais. E jogo pensamentos que tenho tido nos últimos dias.

#1 - Quantos insetos sobrevoam o Neretva durante o pôr do sol em Mostar?

#2 - Tão fácil se livrar das coisas que fizeram parte desses anos. Permaneço com o que já tinha e deixo uma parte pra trás.

#3 - Supo y no supe

#4 - Distribuo meus pertences materiais pela Europa durante esse verão.

#5 - Estou à ponto de realizar meu sonho de infância: visitar Constantinopla e Atenas (embora me divida com a simpatia por Esparta). E meu sonho de pré-adolescência: visitar a Espanha.

#6 - Sou meio sem coração. Às vezes.

#7 - Se retornar a Mostar, não o farei por mim.

#8 - Não tem problema não saber de tudo (e me consolo com tapinhas nos ombros).

#9 - Começo a detestar o verão. Esse calor me consome todas as energias.

#10 - Parei. Parei de vez?

#11 - Não, não tenho medo de partir. Já é hora, não importa a minha lealdade à Tabacaria.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

eu deixarei os versos



(..) Mas então pensei que ainda faltava uma parte a ser desvendada. Por que havia escrito que o poema havia sido muito significativo para mim? Vou lê-lo. Era a Tabacaria. Havia me enganado: não era simplesmente aquele trecho e aquele pedaço do meu caminho debaixo das terras paulistanas. Era a tabacaria do outro lado da rua.  

Estou hoje dividido entre a lealdade que devo à Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora; e à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro

É a sensação de que tudo que passou foi só um sonho e as coisas mais concretas são os lugares físicos e as pequenas lembranças deles. A sensação de que falhei em tudo. Mas a lealdade ridícula que devo ao lugar físico que me proporcionou os sonhos das coisas reais por dentro, como a emoção da última dança no salão escuro e abafado.

E leio as palavras reconhecendo que esse poema se encaixa mais com o que sou agora do com o que fui. Mais com minhas dúvidas e descobertas de agora. 

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou? Ser o que penso? Mas penso tanta coisa! E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos! 

Sabendo que não faço nada além de pensar e pensar, e gastar pensamentos sem escrevê-los, sem lembrá-los. Desperdiço-os sem piedade, por medo de lembra-los, medo de concretizá-los em poesia, em prosa, em versos, em rabiscos discretos.

E sou péssima em escrever sobre finais. Porque tenho medo de mortalizá-los. Medo de torná-los mais banais do que já são. Tenho medo de dramatizá-los e torná-los mais dramáticos do que já são. Tenho esperança de lembrá-los de forma errônea, deslizada, singela. Porque tenho mais medo de saber a verdade no futuro do que de me enganar com falsas lembranças sobre o Dono da Tabacaria e concretas noites sem dormir.

domingo, 18 de maio de 2014

estamos aquí sentados

Na terça-feira, quando eu mal conseguia dormir por conta do estresse, do medo, da loucura que me tomou na última semana, recebi um email de uma grande amiga que há muito não vejo e ela me lembrou de que o tempo que eu passei aqui não foi desperdiçado, nem mesmo um segundo dele, e ela soube me dizer isso estando a dez mil quilômetros de distância, acudindo a aflição que havia me tomado paulatinamente, mesmo que um abraço de consolo tenha me sido oferecido nos últimos segundos em que meu computador funcionava, e eu mal sabia que a ausência do desespero me traria uma ausência ainda maior de solidão e vozes sem nexo algum, enquanto observava o papel parede e a estranha iluminação, com um livro "Guia da América Latina" no meu colo, pensando que talvez o futuro seja mais eloquente do que eu possa imaginar, Go to college!, ele disse, rindo, enquanto me fazia pensar sobre a inexistência de um plano, pensar que agora pra frente há um vazio onde antes havia escola e, que, eu finalmente terminei o colegial, num súbito espasmo de terror, me levantei e parti com uma amiga bielorrúsia, sabendo que não iria mais voltar. Me gustaría escapar.

           mirando cómo nos matan los sueños.

domingo, 11 de maio de 2014

yo no creo en caminos

Cheguei a um ponto de exaustão relacionado à privação de sono que vivi durante esses últimos dois anos - e provavelmente os últimos cinco anos da minha vida. Esse ponto de exaustão me joga num sono exacerbado, desproporcional à minha urgência de absorver conhecimento em um espaço de tempo um tanto quanto limitado.

Mas é assim que me coloco dentro de um mundo de sonhos tão real e palpável que já não sei mais diferenciar o que aconteceu no plano da realidade e o que aconteceu no plano dos sonhos. Já não sei dizer se o encontro com alguém foi parte de um sonho ou se uma conversa aconteceu na vida real. Uma confusão truculenta de falsas memórias que foram implementadas durante meu sono. Estou tão perdida nesse limbo que perco a conta dos copos de café ou das refeições degustadas durante um longo dia de estudo. Já não sei que horas acordei, porque nem sei se sonhava ou vivia. Mas, ora!, viver não é sonhar?

E aqui retomo um pensamento que me desassossegava dois anos atrás, enquanto me preparava pra me despedir da vida que havia vivido por dezesseis anos: por que diabos chamamos sonhos de sonhos? Digo, os sonhos relacionados ao nosso futuro, ao que desejamos. Por que os chamamos pelo mesmo nome que aquilo que não é real fora da nossa cabeça? Talvez seja um pensamento bobo, mas me ponho a pensar se sonhos são inalcançáveis. ("And she said 'dream choice is a university that you apply to but you won't get in.' Thank you, Sensei!") Ou se essa nomeação se refere ao fato de que o futuro está no que fazemos dele, como nossos sonhos de dormir são pura invenção nossa.

Em 11 de abril de 2012, eu escrevi:
Combustível. Essa é uma palavra essencial pra se entender a fragilidade do sonho. Talvez o sonho concreto fosse aquele no qual você não tivesse nenhuma vergonha, e, sim, completo orgulho por aquilo que você fizera na vida, pela pessoa que você se tornara. Um momento em que você olhasse pra trás e não lamentasse nenhum “erro” e não tentasse amenizar nada do que você fizera, não importasse a situação ou com quem você estivesse.
Tanta gente pensa no futuro como um lugar que você alcança através de uma estrada imaginária. Eu não consigo visualizar essa estrada, nem suas curvas e encruzilhadas. Pra mim, o futuro é um borrão, uma coisa completamente indefinida. A próxima palavra que eu vou escrever, e quem sabe apagar, é indefinida, totalmente borrada na minha visão, nesse segundo.

pero que los hay
                        hay

sábado, 10 de maio de 2014

os lemas de um(a) nômade


Enquanto caminhamos de volta pra casa, brincando com os esvoaçantes grãos de pólen que tomam conta do caminho, tentamos desvendar a estranha organização das mãos da rua. Discutimos um filme e o seu final brutalmente inesperado.

No dia seguinte, discutimos o brilhante desenrolar de uma história, que nos intriga. E somos - eu e Mandula - capazes de permanecer em pleno silêncio, absortas em nossos próprios pensamentos - num mundo muito distante além da montanha. Disfrutamos do Festival de Cinema Turco, mesmo que tenhamos em mente que estudar deveria ser uma prioridade a essas alturas do campeonato - talvez mais pra mim do que pra ela.

Entre tantos poréns, deixo-me desapontar comigo mesma, por não lembrar processos químicos e relações entre funções e estruturas. Mas não me parece relevante. Logo esqueço: dois anos (ou duas semanas) de aprendizado resumidos a um pedaço de papel com tinta azul. Não prova meu conhecimento; não prova minha capacidade de raciocínio. E detesto cada vez mais e mais o sistema tradicional de educação: provas, memorização, decoreba.

Adoeço brutamente, como se meu corpo já não mais aguentasse esse uso inútil que tenho feito dele. E enquanto o arrasto pra casa depois de cinco horas de provas, debaixo de um sol pelante de trinta e um graus, penso que números não me atingem e que não me dói pensar que os dias restantes caibam num pedaço de papel.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

ameixas: ame-as ou deixe-as

Putrefação de jabuticabeiras

Porque tenho tido demasiado Leminski em meus tempos de mitigação, deixo uma escolha aleatória dentre todas as cores plásticas que saem das páginas do laranja Toda Poesia que me foi um presente de Natal da minha adorável irmã.
que tudo passe

passe a noite
passe a peste
passe o verão
passe o inverno
passe a guerra
e passe a paz

passe o que nasce
passe o que nem
passe o que faz
passe o que faz-se

que tudo bem
e passe muito bem

Por fim, deixo um artigo sobre o despertar de uma biblioteca antiga. E é com orgulho que também deixo aqui nosso (de todos!) ponto de condensação; meu projeto final.

sexta-feira, 2 de maio de 2014

fifteen days to independence


Por ora, vou dormir com Kandinsky, Piazzolla, algumas informações sobre Sudão, Ruanda e transnacionais em minha mente. Dormir com vários corações na parede (Si y No) e uma sensação engraçada de ter deixado um peso em algum lugar na minha cama (debaixo do travesseiro?). Talvez seja o livro de SAT que joguei na cabeça do Simon; talvez eu tenha deixado na rua, enquanto nos sentávamos na bifurcação.

Hoje algo começa. Hoje algo termina. IB.