quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

também não somos

Quando eu aprendi a escrever, me aventurava nas noites ao lado daqueles baús do meu quarto, enquanto a minha irmã dormia na bicama, a escrever. Escrevia poemas sobre pássaros. Eram vinte e quatro, eu lembro.

Me escondia debaixo da coberta, com uma pequena luz e com a porta fechada, esperando que meus pais não me pegassem às quatro da manhã lendo. Mas não era minha culpa! Eu não conseguia pregar os olhos sabendo que aquelas páginas me reservavam um mundo mais fascinante e que eu lembraria no dia seguinte - ao contrário de meus sonhos. Dormir sempre me pareceu uma grande perda de tempo. Eu me deliciava página pós página, até me dar conta de que as páginas tinham acabado e a noite também. Não me lembro de ter sido uma criança sonolenta. Minha depravação do sono só me tornava mais hiperativa e energética, num efeito contrário que minha família nunca pôde entender.

Quando eu aprendi a escrever, me falaram que eu ia ser escritora. Naquela época, eu dava risada.  Mas não foi só a minha professora da primeira série que me falou isso; foi a mãe do meu vizinho-melhor-amigo; foi minha professora de português da quarta, da quinta, da sexta, da sétima, da oitava série... e também no colegial. Me parecia loucura que todo mundo estivesse me falando aquilo, como se impusessem meu futuro.

Quando criança, eu queria era ser roqueira! Queria ser astronauta, que nem o Marco Pontes - que eu acreditava ser meu primo - pra poder pisar na lua! Eu acho que já quis tudo. Não sei como coube tanto desejo a um serzinho tão pequeno. Já quis exatas, já quis humanas, já quis artes. Já quis tudo junto. Foi por isso que eu sempre me meti a participar de tudo, desde esportes até grêmio; desde violão até tutora de matemática. Talvez nem tenha sido consciente de que eu não fechei o leque. Evitei fazê-lo até o momento em que fosse estritamente necessário.

Agora que me parecia tão certo que eu queria estudar e fazer cinema, aquelas pulgas - que eu crio - vem me incomodar. Vem me fazer questionar, duvidar. Duvidar da minha capacidade. Trazem meu ego de escritora, de artista, de pensadora, de questionadora pra baixo. As pulgas fazem eu me criticar repetidamente. E a questão não é falta de elogios, é a simples falta de confiança. E não é que eu tenha medo do futuro; às vezes, é um puro medo de mim mesma.

A arte não nos sacia como a matemática. Não é exata. Não é findável. Não é completa. E nós também não.

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