Termino a prova vinte e cinco minutos antes de seu término
oficial. Não consigo dormir, embora tente de diversas formas: costas eretas,
costas curvadas, mãos pendendo da mesa, mãos como travesseiro, a apostila da
prova como travesseiro. Não sei por quê. Percebo o tic-tac do meu relógio de
pulso e tento calá-lo. Não consigo. O tic-tac continua ecoando em mim mesmo que
eu não consiga ouvi-lo de meu pulso. Então olho pra cima e percebo outra fonte
intermitente de minha perturbação. O relógio na parede. Começo a narrar a
situação, tentando fazer o tempo passar mais rápido – o que não me parece
necessário. Começo descrevendo o incessante ponteiro e me pego perturbada com a
minha metáfora de ponteiro em forma de cobra. Tento começar de outro ponto. O
futuro. Vejo o futuro tão claramente. O futuro próximo segundo de minha vida...
Passou! E outro! Meu futuro assim tão depressa! E que diabos é o meu futuro se
não os centímetros que se descoloca o ponteiro? E aí penso no porque de estar
sentada ali, naquela prova. Rio por dentro. Nem eu sei a resposta. E penso na
definição de futuro, que pra mim parece tão diferente. Quando se pensa em
futuro, se pensa em faculdade, trabalho, sucesso ou em casamento, filhos,
família. Quanto ao meu futuro, prefiro pensar no meu estado mental, físico,
emocional. Por que nunca me perguntam sobre esses meus desejos para o futuro?
Porque é tão óbvio que eu quero ser saudável e feliz? Engraçado, às vezes
tomamos certas coisas como premissas. Que coisa estúpida. Nunca é como estou,
como estarei, como estava; é sempre o que faço, o que farei e o que fazia. Mas
que desgraça de conjugações! Não sei conjugar em Espanhol (gusta o gustas?).
Repenso uma das questões do teste. E eu perco tempo, às 11h10, pensando nisso
tudo. O que é perder tempo? Porque sinto que perco tempo fazendo essa prova e
perco tempo pensando no meu futuro acadêmico. Por que a sociedade quer tanto
essa educação de alto nível, standardized? A educação vai muito além de salas
de aulas, monografias e trabalhos acadêmicos. Por que passa pela cabeça que
essas horas de estudo e esforço não me servem de nada além de tentar aproximar
esse “futuro” de que tanto me falam? E se eu preferir gastar tempo com a arte? Não
há futuro? É o que dizem. E queria que esses métodos tradicionais de educação
tivessem menos significado. Porque nunca vai ser sobre como estou; vai ser
sempre sobre o que faço. Eu faço ir à escola, faço estudar, faço aplicar, faço
trabalhar. Mas eu não posso fazer felicidade, tristeza, saúde, amor. To do, to
make. E queria mais tempo nesses segundos incansáveis regulados pelo ponteiro
de segundos da sala G2. Olho pela janela e me deparo com o céu azul pleno, as
montanhas marrons e verdes, mas, acima de tudo, me deparo e me encanto com as
aves. Nunca me perguntei que aves negras são essas que sempre avisto pela
janela. E agora as assisto dançando pelos ares, se juntando e se dispersando de
acordo com o balanço do vento. Elas não pensam no futuro, na direção que o
vento vai leva-las. Só dançam com a natureza. Sem fim. E eu, aqui, no meu mundo
individualista e egocêntrico, pensando num futuro que não passa de uma cobra
dançando em volta do centro do relógio. Traiçoeira, arrasta-me ao futuro e
tento voar pra fora. Misericórdia.
PS: esse texto foi escrito após meus SATs, no verso do meu admission ticket por falta de outro papel no qual escrever
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