Um primeiro casamento
Em sonhos meus, eu via os primeiros casamentos em que eu estaria presente. Eu via meus amigos se casando, e eu assistindo da cadeira mais próxima, com um sorriso sarcástico no rosto - feliz pelos meus amigos, incerta sobre a forma de assegurar o compromisso. Quando pensava em casamento, não vivia aquele numa igreja coberta de ouro em suas paredes, e quadros de um homem que foi morto com pregos em uma cruz, mas vivia algo alternativo: talvez as ondas do mar cobrindo a areia e o sol batendo em rostos repletos de amor e aquele olhar que o noivo lançava pra noiva quando ela caminhava para o lado dele; Aquele olhar que parece que vai vazar de tantos sentimentos, que vão cair lágrimas coloridas pra representar cada mínima emoção. E aquele sorriso inevitável brotando nos olhos de alguém com esperanças, com um plano não tão claro pro futuro.
O primeiro casamento que eu assisti em meus sonhos foi atrás de uma livraria em ruínas, cujos livros não mais respiravam ali e em seu lugar havia garrafas de vinho, copos de plástico e pequenas velas formando um coração fogoso no chão asfaltado. Os convidados eram poucos e quase todos tinham um cigarro entre os lábios, dando um ar de calma, de informalidade à cerimônia. Ninguém se sentava: estávamos todos de pé e eu tinha minha câmera em volta do pescoço e em frente ao meus olhos. Vi a cerimônia toda atráves de um buraco de um câmera - algo que me dá um enorme prazer. A cerimônia acontecia numa língua que eu não entendia, mas pouco me importava: o contato e como os corpos se portavam dentro daquele coração - duas mulheres.
Pouco parei pra pensar se aquele sonho fazia algum sentido enquanto ele rodava em minha mente. Pouco parei pra me perguntar se aquilo não era tão precoce, tão impreciso e vulnerável. Mas quando eu acordei num colchão sem lençol, eu me toquei que eu não era a única que sabia que esse casamento não era real.
Prazer Culposo
Naquela tarde, o calor era tão intenso que parecia que eu ia ser derrubada por ondas solares; seria encontrada desmaiada no asfalto, na linha de frente de uma guerra passada: a guerra entre eu e eu mesma. Caminhava em direção ao rio, ao lado de uma certa quantidade de formigas que procuravam doces. Sentei-me no barro, sem me importar em me sujar. Joguei minha cabeça pra trás e senti naquele momento meus pés alinhados e paralelos à correnteza. Eu esperava os segundos se debulharem enquanto meus pés involuntariamente se aproximavam da água e, embora o sol fervesse minha pele, eu sabia que não fervia a água corrente do rio. As emoções passavam tão turbulentas por mim e eu descobri naquele momento: era meu prazer culposo.
Meu prazer culposo era saber o que esperar - o frio, os pés vermelhos e inchados, a vontade de me afastar da água -, mas, ao mesmo tempo, não saber - como nossas sensações são lembradas? E foi quando os segundos passaram e as pontas dos meus dedos e meus calcanhares foram atacados por pequenas ondas d'água, que ferveram meu sangue de gelo e a dor do frio preencheu os nervos dos meus pés. Desafiei-me a deixar os pés por dez segundos debaixo da água e foi como se o tempo parasse enquanto eu contava, em uma língua que não era a minha, o tempo pra me afastar daquilo que me causava dor, porque era aquele me instinto. Mas como tanto mais na vida, eu tentava fugir dos meus instintos e achar minha própria razão e motivos racionais. Quando tirei os pés da água, eles não mais ferviam com o frio, mas meus dedos estavam inchados e vermelhos, meus pés quase roxos. E eu sorri enquanto alguns amigos riam numa mesa próxima a mim.
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