quinta-feira, 6 de junho de 2013

tengo mis dientes pa' cuando me sonrio

Não sei se minha vontade é relatar tudo o que me aconteceu, todos os sentimentos que me surgiram e todos os acontecimentos inesperados... Acho que vou deixar meus dedos me levarem rumo ao que eu assim desejar escrever.
Agora me encontro no Brasil. Depois de os meus 5 meses em Mostar passarem voando, aqui me encontro, sem lenço e sem documento: foi nessa terra que eu cresci. E eu assisti São Paulo enquanto o avião sobrevoava essa cidade gigantesca e fiquei espantada. O que eram aquelas luzes que não acabavam no horizonte?! Que cidade absurdamente gigante! E embora eu esteja ciente de seus 20 mil habitantes, nunca me dei conta... Acho que nunca tive essa noção que me surgiu naquele momento, olhando pela janelinha do avião, sentada no assento 31K ao lado de um senhor italiano, com Cien Años de Soledad no meu colo. Meus pais e Lucas (meu quase irmão) me esperavam no aeroporto e me levaram pra casa enquanto o sol nascia e aguentávamos o trânsito absurdo de Guarulhos até a Vila Madalena.
Fiz minha aparição no Santa Cruz às 9h50. Dei um susto tão tão grande nos meus amigos! Isa e Helo sabiam que eu iria, então me levaram pra dentro do Santa e simplesmente gritaram em pleno pátio "Gente, a So Moreira está aqui" e eu ria de nervoso, de emoção... Uns dias antes tinha tido um pesadelo e sonhado que eu fui no Santa e fui um tanto quanto rejeitada pelos meus amigos... Não foi o que aconteceu. Queria ter uma câmera pra filmar a reação das pessoas que ficaram completaram embasbacadas de me ver ali, de pé, em frente à eles com meus dreadlocks e minhas roupas de verão. Alguns amigos meus levaram mais de um minuto pra processar minha presença e finalmente conseguir me abraçar. Outros vieram correndo desesperadamente depois que os celulares começaram a trocar mensagens sobre a minha chegada e eu me deparei completamente cercada por um bando de faces conhecidas e amadas! E eu ria com a falsa braveza das pessoas por eu não ter avisado que estava vindo. Algumas pessoas tiveram que ficar tocando meu braço pra ter certeza de que eu era real... E estar no Santa, na verdade, foi um tanto quanto surreal.
Nas minhas férias no Brasil, em Dezembro/Janeiro, eu não tinha estado no Santa, já que também era período de férias. Voltar praquele pátio, praqueles corredores, aqueles banheiros e salas de aula foi surreal. Ao mesmo tempo que foi como se eu nunca tivesse ido embora e como voltar no tempo, foi como que um momento pra eu me dar conta de que a minha vida era outra, que aquilo não era mais parte de que eu sou, mas parte de quem eu fui e de quem mudou pra ser quem sou.
Mas acho que mais importante do que a minha retomada no português (incluindo o uso de "vejo vocês!" numa tradução de "see you!") e minha retomada nessa vida, foi a minha partida. Nunca é fácil deixar Mostar. Da última vez foi bem mais difícil, tenho que reconhecer. Sair de Mostar pra Winter Break praticamente partiu meu coração... Eu estava tão "into" tudo aquilo e "into" todas aquelas pessoas, aqueles projetos, aqueles acontecimentos e um certo alguém... O período pré-Winter Break foi o meu melhor em Mostar e eu sei dizer isso sem nenhuma dúvida. Não era a hora de voltar pra cá... Mas deu certo, foi um mês fantástico! Dessa vez, eu também não senti que era hora de deixar Mostar depois de todo aquele amor que flutuava com a formatura e com as despedidas e toda aquela arte que brilhava nas ruas de Mostar, mesmo com aquela chuva e aquele frio absurdos... Não foi fácil dar tchau pra Pauline ou pra Merima, professoras queridas que foram muito importantes pra mim e que vão nos deixar. Quero escrever depois com mais calma sobre minhas visitas à casa de Pauline, ao meu café com Merima e minha ida ao Old Bank com Clara... Mas agora deixo esse suspense de uma saudade que eu já tenho em mente, que não me deixa em lugar nenhum que eu vou, com essa figura de duas mulheres extremamente fortes e interessantes de seus próprios jeitos. Mas deixar Mostar foi aquele "sim" e aquele "não"... Já era mais do que hora dos meus segundos anos se despedirem daquela vida, colocarem os pés na estrada e no mundo, deixarem Mostar e tudo aquilo que eles amaram. E uma das partes mais difíceis de vê-los partindo é me dar conta de que eu vou ter que partir um dia também. E essa noite mesmo eu sonhei com Mostar: com as ruas, com palacinka, Old Bank, Old Town, o telhado, Old Man's e toda aquela cidade cinzenta e colorida que eu tanto aprecio. Acordei pensando que eu nunca vou deixar Mostar... Que Mostar sempre vai estar dentro de mim e vai ser uma parte de mim muito forte; e acho importante que eu comece a pensar nisso agora, que eu me dê conta que eu terei que me desapegar e seguir em frente. Pra muitas pessoas, deixar Mostar não é fácil e vi muitos terceiros anos que ainda são parte daquilo e que não se conformam com o fato de que a experiência deles no UWC Mostar acabou.
Meus últimos dias em Mostar foram... intensos - como tudo que diz respeito ao UWC. Depois que Aisa e Veronika partiram, tive que limpar o quarto e me encontrei deitada uma hora em cada cama, meio sem achar meu lugar naquele espaço. Levei dois dias (na verdade madrugadas sem dormir) pra poder empacotar todas as minhas coisas e enviá-las pra Susac na sexta-feira de manhã. Foi extremamente difícil decidir o que deixar pra trás e o que levar comigo pro Brasil... E ganhei tantas coisas de segundos anos que parecia que nunca ia caber naquelas caixas e malas espalhadas pelo meu quarto minúsculo. Foi aquela confusão que tomou conta do cômodo até que Elissavet (Grécia) adentrou meu quarto na sexta-feira de manhã, trazendo suas malas gigantescas que tanto me lembram do nosso Project Week, pronta para passar duas noites em Musala. Eli é uma das pessoas mais agradáveis do mundo! Pensamos em ser roommates, de tanto que gostamos uma da outra e de tanto que gostamos desses nossos sleepovers no quarto uma da outra, mas achamos que nossos níveis de estudo são muito diferentes e nos estressaríamos demais. Uri (Israel) adentrou meu quarto mais tarde, me acordando da minha soneca, e anunciou que dormiria ali também. Como gosto desse homem! Ele e seu ego entraram pela minha porta e não queria que ele fosse embora no dia seguinte...
Naquela noite, eu percebi de verdade verdadeira que todos nós estávamos virando - e já éramos - segundos anos. Até mandei uma mensagem pro meu primeiro ano brasileiro, porque senti essa necessidade... Mas foi naquela noite, em que todos os restantes em Mostar (a maioria que havia ficado para os SATs que eu também fiz) tiveram que se mudar para Musala e isso incluía praticamente só primeiros anos (com a exceção de Milad, Kim, Pasha, Saffron, Tijana e Berina). Nos encontramos na cozinha, com três violões, enquanto Erika (EUA) e Maxi (Áustria) cozinhavam. Elissavet começou a tocar inocentemente e nos rendeu horas e horas de cantoria e uma alegria e um amor tão intensos! Foi aquela sensação outra vez de "we're the love generation" que eu tanto amo. Foi quando sentamos no muro em frente à Musala e demos tanta risada com as histórias de Mevludin e Slobodan que eu abri aquele sorriso de despedida, de "tchau, Mostar! Mal posso esperar pra te ver em 2,5 meses!". Foi minha última vez sentada no muro com Saffron... E aquele era um lugar tão nosso! Mas eu não chorei com despedidas. Até porque odeio despedidas profundamente... Mas eu estava tão feliz e alegre que nem o fato de quase todos os remanescentes partirem na manhã seguinte abalou esse misto de emoções positivas. Tive que dar um ombro pra Lushik no dia seguinte, algo que não fazia há algum tempo e que me causou certa nostalgia do semestre passado. Lushik havia se mudado para o quarto que pertencia a Noor e Weronika, o quarto ao lado do meu, então abríamos as duas portas e circulávamos de um para o outro. Passamos horas na varanda (algo que eu disse a Weronika num email que escrevi hoje que tenho muita vergonha de não ter feito com ela) conversando e fomos dar nossa caminhada deliciosa por Old Town naquele dia 2 de junho ensolarado em que a chuva nos deu um descanso. Sentamos ao lado do rio e nos deliciamos com o silêncio e com a nossa cantoria desafinada.
Naquela noite, sentei no porão com Markus comendo pão de queijo e limpando o chão. Não foi triste. Muito pelo contrário. Foi quase como qualquer outro momento que passamos juntos, dando risada e pensando em coisas banais e não banais. Naquela noite, Megan (Reino Unido), uma terceiro ano fofíssima, reapareceu em Mostar (após já ter ido embora depois da formatura de seus primeiros anos) e pediu pra dormir no meu quarto porque não queria dormir sozinha no quarto da sua primeiro ano, Gwenno, que já havia partido. Ficamos horas conversando e partimos de manhã juntas no ônibus pra Dubrovnik. Deixei Mostar pra trás pra me deparar com o litoral croata, que é uma das coisas mais lindas que eu já vi. Minha viagem de 30 horas de volta pra casa dos meus pais em São Paulo foi longa e foi quase como Cien Años de Soledad.

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