"Cada dia ainda é uma aventura", li no blog de uma primeiro ano; e sorri. Sinto o pesar de que muitos primeiros anos estão infelizes, com saudade enormes de casa, tendo dificuldade para fazer amigos. Tamar e eu ficamos muito tempo ontem discutindo isso, tentando entender os motivos, tentando entender porque não vimos isso na nossa geração nos nossos primeiros meses. Não dá pra comparar gerações e personalidades: somos todos tão diferentes de todas nossas formas doidas e indescritíveis.
O fato de esse lugar ser uma aventura diária muita vezes é esquecido. Quando entramos na rotina, quando começamos a ser passivos sobre esse lugar, a extraordinariedade desse lugar e dessa gente. Ontem, me dei conta de como estou sendo tão passiva a tudo e me causou tanto desgosto que não podia fazer nada além de me deitar na cama e dormir, ignorando o despertador. Fui salva por meu primeiro ano, que me trouxe de volta dos meus sonhos, enquanto eu me espreguiçava e tentava falar como se não tivesse acabado de acordar.
Meu dia provou-se mágico quando fui 'surpreendida' pela chegada daquela mulher de cabelos fogosos que havia nos deixado quase um ano atrás. Ela parecia tão perdida e confusa ao estar de volta a Mostar que não quis incomodá-la com minha euforia. Senti uma energia estranha dela; percebi que estava confusa não só pelos dois dias de viagem, mas por aqueles amigos que ela disse terem sido 'amigos imaginários' durante todo esse tempo que ela esteve longe de Mostar. Causou-me um júbilo quase que doloroso ver Uri tão feliz com a presença de Iida e me fez ver além do muro de pedra que ele é.
Depois de três semanas num estado meio doente, finalmente fui ao Climbing Hall, sair do chão que me puxa para baixo com a gravidade invencível do planeta Terra. "Sinto que é mais um esforço mental do que físico", Chiara me disse. Chiara é minha aprendiz; ela ficou vidrada quando descobriu que eu fazia telas - como disse - e me pediu na hora que eu a ensina-se o que sei; óbvio que concordei. E nessas últimas semanas, ela tem aprendido tão rapidamente e com tal facilidade que me deixa orgulhosa de uma forma engraçada. No final do nosso treino, Chiara me disse "me faz tão feliz..." e eu sorri com todos os meus dentes, concordando de todas as formas possíveis, reconhecendo outra vez o quanto o tecido me faz bem e quão importante é ter essa hora na minha semana em que, não importa o quão ocupada eu esteja, eu pararei pra me acalmar, pra deixar meus problemas todos no chão, debaixo dos meus pés e de todo meu leve corpo. Saí do Climbing Hall sozinha, assustada com a neblina e a umidade do ar, que me assustava a cada passo, com aquele silêncio, o frio e ainda aquele barulho do resto da água da chuva escorrendo das árvores e das ruínas. A escuridão me calava e me fazia implorar aos meus pés que se calassem também. Me sentia tão leve enquanto caminhava naquele lugar que gosto de chamar de caminho da roça ou caminho das amoras e me levei até Abrasevic, onde destruí toda minha felicidade com uma frustração imensa por conta de derivadas e limites, coisas que não pretendo usar na minha vida. Dor de cabeça. Corri pro quarto de Tamar pra um abraço e uma caminhada curta até a wall de Musala. Nos juntamos a um grupo de pessoas no quarto de Uri, num aconchego causado pela presença de Iida e foi quase como um flashback; um ano atrás.
Pego-me ansiosa para fugir do outono de Mostar, ir para Montenegro com Tamar e relaxar por alguns dias. Talvez seja mais fácil ver aventuras em coisas mais radicais. Precisamos de um mapa...
"Vejo os alunos andando por aí... Sempre reparo nos caminhares. Você anda de uma forma meio incerta, mas aí olho pro seu rosto e vejo uma expressão calma e serena que pode ser traduzida em... satisfação." Greg, prof de Psicologia, meu tutor.
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