terça-feira, 26 de novembro de 2013

el miedo de volver

Ando procurada. Me procuram a vizinha, o amigo do primeiro andar, a amiga da outra residência, os membros da minha comissão, o prefeito, o delegado, o padeiro português. Ando desparecida. Me llaman el desaparecido que cuando llega ya se ha ido. Volando vengo, volando voy, deprisa deprisa a rumbo perdido.
Me encontrei fora de atividade literária por dias e dias. Não sei ao certo se foram só dias ou semanas ou meses, só sei que me pareceu muito estranho não ter escrito sobre tanto que tem acontecido e que aconteceu. O mundo que os Maias previram. "What is missing for the world to collapse?", diz uma sábia mulher enquanto dá voltas pelo quarto, comendo maçã com uma faca na outra mão. Não sei o que responder, até porque não sei até que ponto concordo. Mas de fato, parece que temos que carregar tudo nos ombros e andar em frente, com a cabeça erguida. Não há tempo. Una mezcla de tensão e idiotice. Uma pena. Três semanas sem grandes amigos; um semestre sem um outro, que se vai depois de tanta estupidez.
Foi difícil me convencer de que eu tinha que ignorar todo aquele peso e continuar com os planos de ir para Sarajevo com Chiara, Paula e Marta. Não me arrependo um só segundo. No Sábado, estávamos eu, Chiara e Ema (BiH) no Mepas Mall (o maior shopping the Mostar), em frente ao supermercado, pedindo doações de comida e itens de higiene para o Refugee Camp Tasovicici. Arrisquei frases em local e me surpreendi comigo mesma approaching desconhecidos - algo que eu normalmente seria incapaz de fazer. Horas depois, tomávamos o ônibus pra Sarajevo.
A viagem de ônibus pra Sarajevo é como um sonho. Sempre me surpreendo com as diferentes cores do Neretva dependendo do sol, da temperatura e da estação. Foi quando estávamos chegando em Sarajevo que as cores da cidade me fizeram prender a respiração. As cores das folhas de outono, das montanhas, dos prédios coloridos em cores pasteis e o asfalto molhada por conta da chuva. Aquela cidade respira e vive. Andar pelas ruas de Sarajevo me faz sentir uma energia completamente indescritível. Uma capital tão pequena e tão bela. Inacreditável. E cada vez que me encontro lá, me apaixono mais e mais pelas pontes, pelo rio, pela Maršala Tita. Tão próxima e tão diferente de Mostar. A "Jerusalém Europeia".
Penso em um peixe dourado, em cereja, uma maçã de contos de fada, aqueles cinco minutos de silêncio absoluto no alto de Sarajevo. Penso em vilarejo de esqui, em portas cerradas, em contos e verdades. Em neve. Um final de semana maravilhoso que passei junto a três primeiros anos que deixaram de ser simplesmente primeiros anos e se tornaram amigas. Não só com elas, mas também com o grupo de seis outros primeiros anos que acabaram se juntando a nós em Ljubičica: Lucas, Simon, Noam, Anette, Mandula e Bono. Queridos. Olvidé mis responsabilidades por algunos segundos. Fomos à exposição sobre o massacre de Srebrenica e me encontrei naquele silêncio, ao lado de Mandula, sem saber o que pensar e o que sentir, mas sabendo claramente o quão apelativo aquele ambiente era. Me sentei em Golden Fish com Pauline e conversei por tempos e tempos. Paguei sem café e foi só assim.
Pisei em Susac, buscando uma senhorita turca. Me encontrei em diversos quartos. Co-anos. Segundos anos. São os mesmos. Sufocantes e amados. Só queria retornar a Sarajevo e não ter que digerir todas minhas responsabilidades e meu futuro. Tempos de balanços azuis-celeste.





Chiara

Chiara e Marta

Paula - no topo de Sarajevo

Marta em Golden Fish

No estoy sentado
en el lugar donde deberia estar,
mas tranquilo amigo!
Ya voy a llegar...

sábado, 9 de novembro de 2013

dores de travesseiro

Acordei com muita dor. Mal consegui me levantar e nem abaixar pra limpar o resto de incenso no chão do meu quarto. Nem acreditei que essa semana tinha passado. Lembro de ter pensado no começo da semana que aqueles dias me destruiriam: não o foi. Embora, de foto, tenha estudado mais do que o normal - e menos do que eu havia planejado -, não me parece que a destruição que eu havia previsto aconteceu.
Finalmente terminei de ler o livro de Aleksandar Hemon (o escritor nascido em Sarajevo que foi para a Flip, em Paraty, esse ano) que me foi enviado como um presente de meus tios queridos. O final do livro me deixou meio impactada, enquanto comia meu café da manhã na cozinha de Musala. Senti a dor nas minhas costas outra vez. Não me dei tempo pra digerir as histórias da vida de Hemon, porque precisava estudar sobre a China: precisava terminar (ou continuar) minha Investigação Histórica sobre a influência do período de resistência ao Japão no crescimento do Partido Comunista Chinês.
Chloe foi embora por 6 semanas. Minha querida vizinha e amiga se foi e só quando dei o meu último abraço nela me dei conta de que 6 semanas é praticamente o que passamos durante o Summer Break. E sinto muito que ela vá perder tudo o que vai acontecer nessas próximas incríveis semanas - que foram as melhores do meu primeiro ano. Mas sei que ela precisa ir pra casa, precisa de um tempo pra melhorar, pra ser feliz e pra voltar sendo a Chloe que eu admiro e adoro.
As preparações pra Semana Cultural da América Latina, América do Norte e Países Nórdicos estão com toda a potência. Tivemos nossa primeira reunião e as ideias me parecem incríveis. E fui dormir naquela noite com mil ideias na cabeça e acordei sabendo o que queria do vídeo de promoção da Semana Cultural. Então nesse momento, finalmente me forço a arranjar um tempo pra me dedicar ao que gosto.
Recebi uma correspondência de Ringling essa semana, que me fez conversar com Lucas por um bom tempo. Temos ideias diferentes para o nosso futuro, mas ao mesmo tempo sei que nos entendemos de uma forma que ninguém mais me entenderia aqui sobre o vestibular, sobre a relutância em ir para os Estados Unidos (embora Lucas não compartilhe da mesma opinião que eu sobre esse último aspecto)... Ringling não me parece uma opção, mas essa maldita capacidade de fazer propaganda e comprar as pessoas com aquele catálogo incrível que te dá água na boca... Maldito dinheiro estadunidense.
Mas pra terminar a minha semana, tive uma hora de Yoga, com a maravilhosa Chiara, e uma hora e meia de futebol, na quadra atrás do prédio da escola. Esportes me deixam feliz (acredite se quiser, família). Mesmo que meu time tenha perdido de 6x2...
E agora estou na ansiedade do long weekend (daqui a duas semanas): Sarajevo com queridas primeiro anos: Marta (Espanha), Paula (Áustria) e Chiara (Áustria). Paixão por Sarajevo.

PS: Exatamente há 20 anos, no dia 9 de novembro de 1993, a Old Bridge de Mostar (Stari Most, que inspirou o nome da cidade) foi destruída no contexto da guerra. Tão recente...

domingo, 3 de novembro de 2013

sail with me into the dark

Coloco uma música no replay. Sento no same old place em que Quinten sempre se encontrava ano passado e que adotei esse ano. A música começa com poucas batidas e explosões começam. A música representa aquelas horas em que fico sentada ali, recebendo um turbilhão de informações em tempo real. Prisão, polícia, protestos. Final de colegial, formatura, vestibular.
Día de los Muertos.
Estou cansada. Exausta. Acordei cedo essa manhã e fui correr. Me aventurei por ruas de Mostar, por lugares que nunca tinha descoberto. Encontrei cemitério atrás de cemitério. Não podia me jogar na cama, porque meu lençóis estavam na máquina de secar e me restou finalmente dar o presente de aniversário (atrasado) que Lera e eu preparamos pra Amina: uma coleção de coisas (in)úteis.
Uma semana cansativa, mas boa... Celebramos o aniversário de Noam entre latinos na praia (talvez minha última vez deitada nas pedras, na margem do Neretva). Recebi uma surpresa (quase) inesperada de uma primeiro ano querida, Tati, que está estudando no Adriático. Tive a oportunidade de me divertir com ela, mas também de ter papos sérios, de sentar pra comer uma pizza (não tão boa quanto a italiana) e de dançar Ai Se Eu te Pego na festa de Halloween: eu de pirata, Lucas e Tati de Família Adams.
Depois desse long weekend de muita informação sobre as Filipinas, finalmente acabei meu Internal Assessment de Peace and Conflicts, uma matéria misteriosa que gosto mais e mais a cada trabalho.
De novo me sento, ouvindo a mesma música over and over again, conversando com Maud. Penso naquele abraço de ontem. Me senti confortável nos braços da minha melhor amiga desaparecida, mas que nunca deixa de ser minha melhor amiga, nas escadarias da entrada de um prédio, com meu guarda-chuva na mão e aquela "breath in, breath out" que quase tinha esquecido.