terça-feira, 30 de outubro de 2012

sol frio, america e 'home'

O dia amanheceu ensolarado. Nada de chuva! Quem diria!! Pareceu tudo mais leve e calma, embora os raios de sol me lembrassem de que estou na Europa - nada de calorzinho na pele.
No caminho da canteen pra escola, vi uma garota de cabelos negros cacheados e não consegui conter a urgência de correr e abraçá-la. Bengisu estava de volta e senti que não a via a séculos! Nos segundos que levamos pra subir as escadas, tentamos ajustar nossas agendas e "ir para um café", mas pareceu um tanto quanto complicado.
Biology, Math, Peace&Conflicts e History passaram lentamente, mas nada que uma ex-aluna da Beth (meu amor por ela, mas zero por Física) não possa aguentar. As boas notícias do dia também foram ter Mario (Espanha) e Yuval (Israel) de volta da Itália, Carme (Catalunia) e Tamar (Israel/Georgia) de volta de Budapeste, receber um cartão postal de uma amiga muito querida vivendo em Londres (obrigada, Jo!) e um desenho de um querido co-year (obrigada, Gre!).
Em vez de almoçar, me enfiei no Spanish Room, completamente vazio, e sentei pra ler artigos sobre o conflito entre Irã e Israel. Nesse momento, entraram Aurelia e um homem loiro, alto, muito elegante e bonito: seu pai, com quem jantaria mais tarde. Ele não só é super simpático - e fala português -, como também é diplomata e começou a conversar comigo sobre MUN. Momentos depois, recebi um e-mail dizendo que a sessão da MUN havia sido adiada para a semana seguinte, o que me deixou absurdamente contente: café com Bengisu depois de B block!!!
A aula de English foi deliciosa! Lisa, nossa professora, juntou todos os discursos presidenciais americanos editados por nós (escolhi um discurso muito bom do Reagan) e nos entregou um booklet. Analisamos todos juntos o discurso de Lincoln, selecionado por Lushik (Egito), e depois eu e Tamar (Israel/Georgia) analisamos dois discursos de Bush. E, nossa, cada palavra que eu lia me fazia odiar mais e mais essa criatura. Não que eu não desgostasse dele antes, mas as palavras dele pegaram nos meus nervos. E comecei a resmungar muito pelo fato de ele NUNCA se referir ao seu país como "United States", "US" ou qualquer coisa do tipo, mas sempre como "America". Óbvio que eu entendo muito bem o que tem por trás disso: chamar o país de America dá uma noção de unidade, de união; enquanto United States deixa bem claro que o país é dividido em regiões que são unidas. Mas começou assim e Erika (U.S.) se proclamou e disse que fica irritada com a minha insistência em reclamar do uso do termo "America" e "americans". Eu disse que tinha aceitado o fato de que ela era "american", já que a ONU reconhece-a como americana, e não há nada que eu posso fazer em relação à isso; mas nunca, NUNCA, vou aceitar que chamem os EUA de America, porque eles não são. E o que ela me solta? "Os EUA são America porque nós somos o país mais influente do continente.". Não resisti e respondi sarcasticamente "Ah, então a Alemanha é a Europa." e a classe inteira fez barulhos me mostrando que a coisa tinha ficado um pouco feia. É óbvio que eu não estava falando sério e todos sabiam disso, mas a comparação foi um tanto quanto... delicada. Por que, hein? Só porque a America é composta por países de terceiro mundo e os EUA, enquanto a Europa tem vários países de primeiro mundo? No final da aula, pedi desculpas pra Erika e ela sorriu e disse que simplesmente precisa se defender nessa.
Uma curiosidade que aprendi na aula de inglês: a estrada principal que atravessa a Albânia só tem uma mão. Isso porque os albaneses não queriam que os EUA usassem a estrada com pista de pouso.

Fui com Bengisu para um café no News Bar. Nunca tínhamos ido lá, mas acabamos descobrindo ser um lugar incrivelmente delicioso (embora o café não tanto...). Bengisu contou-me tudo sobre sua viagem para Ljubljana, sobre a meia-maratona que ela correu e tudo o mais sobre seu Bajram. Depois tivemos a oportunidade de sentar e conversar sobre nossa vida em Mostar, sobre nossas impressões e sentimentos. E sempre trazemos à tona o assunto de que nos sentimos "home" quando estamos juntas. Não importa se estamos só sentadas uma do lado da outra estudando na frente dos nossos computadores: é simplesmente a energia e a companhia que são boas demais!! Começamos a fazer planos pro próximo termo - e percebemos que esse termo está bem no final... Depois de horas conversando, voltamos pra Musala e ajudei-a a escolher uma roupa pra usar no seu jantar com membros do consulado turco em Mostar.

Caminhei com Sara (França), Mario (Espanha) e Chloe (Reino Unido) para o restaurante, onde nos juntamos com Aurelia (Alemanha/Indonesia/China), seu pai, seu irmão (usando um casaco do CISV Brasil!!!), Carme (Catalunia), Tamar (Israel/Georgia), Yuval (Israel) e Si-Jull (Alemanha/Coreia do Sul). Tivemos um jantar maravilhoso em Del Rio, logo no final da ponte, no caminho de Musala para Mepas Mall. O pai de Aurelia perguntou-nos várias coisas sobre o colégio, sobre nossos processos seletivos, sobre nossos países... Ele sabe muito sobre tudo e fala 13 línguas fluentemente. Foi um dos melhores momentos que tive em Mostar até agora. Pessoas maravilhosas! E adorei estar com pessoas de Susac (somente Chloe e eu estamos em Musala) e somente co-years (nada de reclamações rotineiras e arrogância típica dos lindões dos meus second years). Depois do jantar e depois que Aurelia partiu de taxi com seu pai e seu irmão, tivemos um momento de abraço coletivo (em que eu fui sufocada no meio, obviamente) fantástico. Sentimento de união.

Minha horrível punição por não estar no meu quarto ontem pro check-in foi limpar todos os banheiros do segundo andar. O que é um tanto quanto estúpida, já que, de fato, era o meu dia de limpá-los. Mas ok, acho que a Alisa acha que eu sou bobinha e não tinha percebido isso. Fiz uma longa massagem em Toam, tentando passar toda a energia positiva possível: suas costas estão absurdamente tensas e tudo nela está tenso com as finais se aproximando. Queria ter tocado Marcos Ariel, pra imitar a mamãe e a Tha, mas descobri que esqueci de colocar o álbum do cdzinho laranja no meu Itunes...

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

correria

De volta à Mostar. Vida boa. Poucas horas de sono, almoço corrido e corrida pra escola debaixo da chuva (tenho que usar a capa de chuva pra proteger minha mochila em vez de me proteger.... e meu guarda chuva ainda não retornou ao meu poder...). Mas nada como ter minha linda parede de volta e quartos diferentes nos quais entrar. Ah, vida residencial...!
Hoje tive tutor meeting na hora do almoço. Recebi minhas notas dessa grading session (0-7):

History HL: 7
Math SL: 7 (100%!!!)
English A - Lang&Lit HL: 5  (maldita homework mal feita)
Biology HL: 7
Peace&Conflicts: 6

Fiquei bastante satisfeita, principalmente considerando o quão preocupada (por favor, leia-se ironia) eu estive com a escola. Óbvio que tenho assistido a todas as aulas e feito todas as lições necessárias, mas a primeira grading session não vale absolutamente nada. É a única que não é enviada quando você aplica pras universidades e também não é muito bom tirar notas altas, porque os professores vão sempre esperar algo bom de você (e você pode acabar os decepcionando).
O dia pode parecer feio e desagradável. Mas depois de horas no lugar mais confortável da residência, ouvindo Johnny Cash e rindo debaixo de uma coberta azul, você percebe que não há frio que destrua a alegria. Especialmente aquela alegria de uma coisa nova, de uma corda desafinada no violão ao som de "Redemption Song" ou "It's Not Time", de uma gritaria numa língua que eu não entendo, de um frio inexistente no calor da vida.
No final das contas, esse frio é psicológico - eu sempre digo. "Você vai ficar doente, Sofia!". Quem vocês são?! Minha mãe?! Já tenho uma - muito friorenta por sinal -, muito obrigada!

Amanhã: sessão da MUN sobre o conflito entre o Irã e Israel. Fui escolhida pra ser a delegação da França (minha participação como Venezuela na última sessão foi bem positiva - os líderes gostaram), o que significa que eu tenho poder de veto! Isso é tão emocionante!! Dessa vez, quero fazer direito, me arriscar, me inscrever na lista de "general speakers", discursar e falar qualquer besteira que vier na minha cabeça desde que soe bem; prestar atenção em cada palavra que meus colegas falam pra encontrar o mínimo erro. Quero fazer direito, como ainda não tive energia ou tempo pra fazer. E MUN é uma coisa muito importante pra mim, já que eu ainda considero estudar Diplomacia e/ou Relações Internacionais. Embora me fascine, também é um tanto quanto chato de vez em quando. Especialmente porque as coisas estão muito no ar e porque meus co-years (incluindo a mim mesma) não entendem como funcionam as sessões e não conseguem se manifestar. E os segundos anos também não ajudam, porque a maioria deles não arranja tempo pra ir às sessões e acabamos sendo sempre nós, primeiros anos, e os quatro segundos anos que são líderes do CAS.

'I don't know if it's the same where you live, but here there are people who grub around sniffing out moral corruption, and when they've found it they put it in a good job somewhere where they can keep an eye on it. The honest man probably find himself left out in the cold.'

'Well, I suppose the sick need looking after.'

'There you are! That's the sort of theory that's turning the community into a regular hospital!' 

Henrik Ibsen - "A Doll's House"

domingo, 28 de outubro de 2012

lembranças de um break

Chá de Hibisco;
Sol poente visto de uma ponte;
Baclava;
Tito emoldurado na parede;
Calor africano;
Show de Turbo Folk bósnio;
Tiramissu;
Entrevistas e perguntas;
Abraços;
Palavras incompreendidas;
Cobertor pesado;
Chinese Shop;
Brincos de dados;
Mesquista e campo de futebol;
Igreja privada;
Fotos com negras;
Trem;
Saudade;
Armário de espelhos;
Sapatos pra fora;
Gorro feito sobre medida;
Sutra;
Jedam;
Odma;
Cheiro insuportável de cigarro impregnado;
Banheiro mais nojento da minha vida;
Cícero;
Ansiedade pra Winter Break.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

um verdadeiro Bajram na Bósnia central

Acordar de manhã com sons de tiro e, por um segundo, pensar que a guerra está de volta: não tem preço. O Bajram começa!
O Bajram é (segundo minha fonte confiável, Adis Kadic) o feriado muçulmano que comemora o momento em que Ibrahim foi informado por Deus que não precisava matar seu filho, e, sim, um carneiro. Então, nesse dia, os muçulmanos matam um carneiro vivo e o cozinham - por isso os tiros.
É o feriado mais incrível – pelo menos aqui em Zavidovici! Os adolescentes e crianças vão batendo em todas as portas de vizinhos desejando Feliz Bajram e ganham balas e/ou dinheiro em troca. Além disso, a porta da casa fica aberta e os adultos entram de casa em casa pra comer alguma coisa que lhes é oferecida.
Tive o almoço mais fantástico desde que cheguei na BiH: sopa (de algo), lombo, batatas assadas, backlava e tiramissu. A história do último é a seguinte: ontem à tarde, a televisão estava ligada num canal de culinária (que a mãe de Adis adora) e o apresentador estava ensinando a fazer tiramissu. Eu fiz um som de “huummm” e quando cheguei em casa mais tarde, lá estava, o tiramissu pronto e delicioso. Nada como comida caseira.
Ganhei 10 KM (13 reais) do tio e tia de Adis e uma barra de chocolate da “prima” da família. Embora seja estranho sentar no sofá por horas e os ouvir conversando em bósnio, chega a ser engraçado. Eu e Adis fomos visitar uma amiga dele, Edina, que se inscreveu no processo seletivo do UWC e chegou até a última fase.
Às 18h, fomos buscar Peya e Merima na estação de ônibus. Peya veio passar o Bajram na casa de Merima, que é num vilarejo a 40 km de distância de Zavidovici. Finalmente alguém pra conversar em inglês ao invés de ficar olhando que nem uma tonta toda vez que Adis cruza com alguém na rua (acredita, acontece a cada cinco passos)! Fomos de volta pra casa e ficamos um bom tempo conversando.
O plano agora é ir pra uma festa num bar chamado Que Pasa e depois para o show de Sasa sei-lá-o-quê, que é um cantor cego bósnio. A vida sem check-in (outra vez) significa voltar para casa de madrugada. Peya e Merima dormirão aqui.

Bajram Serif Mubarek Olsun!




quinta-feira, 25 de outubro de 2012

um dia em Zavidovici

Um dia comprido. Fui acordada às 11h por um toque suave e imediatamente levantei a cabeça. Tive a oportunidade de ver uma bela árvore pela janela, com o sol abraçando suas folhas de outono.
Saímos para comer cevapi. Surpresa: finalmente um cevapi decente. Sentamo-nos em um bar, na frente de uma feira na qual Roma people vendem frutas e vegetais. Lembrou-me da feira de quinta (Terça? Já não me recordo) do lado da casa da Sofia.
Aguardei sentada no sofá, na sala de espera do dentista. Fechei os olhos e pensei em Mostar. Nas pessoas incríveis das quais já sentia saudade.

Atravessamos a ponte que passa por cima de Bosna, o rio que dá nome ao país - e que supostamente é poluído, embora tenha peixes. Caminhamos até a antiga escola de Adis. O cara é absurdamente popular. Entramos na sala de química, na de biologia e na de história. Senti-me estupidamente envergonhada na frente de tanta gente fascinada pelo fato de eu ser brasileira. Pessoas pedindo que eu dançasse samba ou perguntando sobre jogadores de futebol e basquetebol famosos. O professor de biologia fascinou-me contando que assistiu a um jogo do Santos (não sei contra quem) em Sarajevo trinta anos atrás: ele viu Pelé jogar ao vivo. Depois de um tempo conversando com o simpático senhor, ele admitiu entender porque Adis havia escolhido para estudar no UWC: ele via nos meus olhos o mesmo que via nos olhos de Adis. Isto é, uma vivacidade e um desejo poderoso de fazer. Adis sorria enquanto traduzia as palavras confusas do bósnio para o inglês.
Engraçado é que o povo daqui fica encantado pelo meu cabelo: preto, longo e encaracolado. Meus pais disseram que não viram ninguém de cabelos cacheados na BiH, mas não é verdade... Existem pessoas, mas são raras. E acho que ninguém tem o cabelo tão preto quanto o meu aqui...
Enfim, tomamos um café num bar chamado “Que Pasa”. Cidade pequena: encontramos Dino sentado com dois amigos. Em seguida, Adis me levou para ver um monumento da cidade com centenas de nomes de pessoas mortas durante a guerra e fui surpreendida com tantos sobrenomes conhecidos, pertencentes a colegas meus no colégio. E todos os sobrenomes – praticamente – terminam em “ic”.
Encontramos tanta gente na rua que é doido. Adis conhece todo mundo nessa cidade. O que é compreensível, considerando o tamanho. Conheci duas amigas super simpáticas chamadas Ines e Tamara: finalmente pessoas falando em inglês, tentando falar comigo diretamente ao invés de pedir que Adis fizesse o papel de tradutor. Tamara questionou-me sobre a minha escolha de estar na Bósnia-Herzegovina. Conversamos um pouco sobre a guerra e ela me explicou – como Adis já havia – que Zavidovici é uma cidade com pouca ou nenhuma divisão: ninguém se diferencia por conta da religião ou da “nacionalidade” e a igreja e a mesquita são literalmente vizinhas.
O sol já havia se posto quando chegamos em casa, pegamos nossos computadores e fomos para The Scene, um bar com wi-fi. Adis não tem wi-fi na casa dele e foi ótimo entrar em contato com minha família, com meus amigos lá no Brasil e com aqueles esperando em Mostar. Quando entramos, o bar estava vazio; quando saímos, deixamos os únicos lugares livres.
Tive um jantar caseiro: pimenta recheada (que nem em casa, mãe!) e purê de batata; para sobremesa: baclava (!!) e tiramissu (!!). Depois uma sessão de fotos para Adis, mostrando São Paulo, Paraty, Ubatuba, Iporanga... Deu uma saudadezinha da terrinha! Saudade de Paraty (para ti e para todos, parurulas), principalmente.






quarta-feira, 24 de outubro de 2012

preparativos, trem e recepção

Tudo começou com duas horas de antecedência para acordar. Tirar as coisas do varal: check. Colocar roupas de inverno na mala: check. Uma aula insuportável de matemática e um abraço longo em uma certa holandesa, sabendo que só a veria dali a uma semana. Almoço ao lado de uma turca muito querida que parece que passo mais tempo longe do que perto, de tão grande que é a saudade quando acabamos nos desencontrando por estarmos em aulas completamente diferentes e projetos opostos, mas que é a minha metade aqui (principalmente pelo cabelo negro cacheado).
Amigos indo pra Vienna. Amigos indo pra Budapeste. Amigos indo pra Zagreb. E “locais” indo pras suas casas pra aproveitar o feriado com a família e amigos antigos. Depois de uma semana me perguntando se deveria aceitar a proposta de Adis para ir pra casa dele, pensei “por que não?”. Será incrível experimentar um feriado muçulmano!
Achava que o trem sairia às 18h. E depois de ficar um bom tempo nos degraus da escada na frente de Musala conversando Toam, achei que Adis havia desistido de me levar pra casa. O jantar: batatas fritas e salada. Amigos felizes por acharem que eu acabaria ficando – já que abandonada. Mas um taxi para de frente da residência e Dino e Adis pulam pra fora com mochilas e malas. O trem só parte às 18h40.
Primeira viagem de trem: sem lugar pra sentar. Sentei-me em cima da mala do Haris e fiquei horas ouvindo Almedin tirando sarro da minha cara. Dino dormiu ouvindo música e Adis cochilou no chão do trem. Haris nos deixou um pouco antes da nossa parada e pude sentar na frente de Almedin e apostar uma palacinka que eu não dormiria durante as 6h de viagem.
Em Sarajevo, fizemos conexão. Saltamos do trem e o que tínhamos que pegar estava logo ali, na nossa frente. Subimos e encontramos um trem bastante lotado. Eu e Adis conseguimos lugar numa cabine com outros dois homens. Um deles ficou absurdamente feliz por eu ser brasileira e não parava de me falar coisas – as quais Adis tinha que traduzir. Quis calar a boca do senhor, com todo o respeito. Liguei meu computador, coloquei fones de ouvido e assisti a Central do Brasil com Adis vendo as imagens passando na tela do meu computador e provavelmente não entendendo nada além de choros de Josué.
Finalmente chegamos a Zavidovici. O pai de Dino nos buscou na estação de carro. O engraçado é que quando pulei do trem, senti como se estivesse em tempos de guerra. O trem velho, assim como nos filmes, ruindo e um senhor soprando um apito para que todos descessem do trem. Atravessando trilhos na terra e o escuro da meia noite.
Fui parar na porta de uma casa deliciosamente pequena. Os muçulmanos tem uma tradição de não entrar de sapatos na casa. Delícia andar de pantufas por aí, comer muito e ser oferecida mais e mais comida. Adis mora com a avó e com a mãe, que não falam nada de inglês, mas são uns amores. Disseram-me que nevará no sábado.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

anniversary #2

Dois meses em Mostar significa acordar de manhã cedo sabendo que é dia de tomar sorvete e ir na nossa praia. Achei que Bo só voltaria da caminhada no dia seguinte e isso me entristeceu um pouco. Por isso, encontrar ela de toalha no corredor do segundo andar foi a maior alegria do dia.
Às 20h, fui ao quarto de Ali busca-la, depois de ter indo com Toam no shopping comprar uma faca decente pra cozinhar e um fervedor de água elétrico. Paramos na sorveteria Musala e depois caminhamos para a nossa praia, enquanto a ouvia contando sobre os dias maravilhosos que ela teve caminhando com um grupo incrível de pessoas e tendo muita diversão. Sentamos em frente ao rio, entre as duas pontes, como fizemos no primeiro dia em Mostar.
Contamos sobre os pontos altos das nossas Project Weeks. Incrível como a semana foi longa: parece que não via Bo há um mês, principalmente porque tínhamos tanta coisa pra contar uma pra outra.
Ela tinha que estudar pra uma prova do dia seguinte e eu tinha um Skype marcado (com uma Flávia querida), por isso estávamos com o tempo contado. Mas não vimos o tempo passar. Ficamos lá, debaixo das poucas – mas muitas pro padrão paulista – estrelas de Mostar, conversando sobre nossas mudanças pessoais durante esses dois meses. Conversamos sobre o futuro, sobre o presente, sobre o passado. Conversar com Bo é sempre sinônimo de paz, de calmaria, de risadas e sinceridades. Conversamos sobre a relação dela com Ali, sobre como viver o presente é importante (ela tem um grande adesivo “Carpe Diem” na janela do quarto) e muitas pessoas daqui não se dão ao trabalho de se envolver em relações por saberem que acabarão.
Ah, Bo é uma das pessoas mais ativas da nossa geração. Ela está sempre querendo criar algum projeto. O que eu gosto nela é que ela não só reclama e fala, mas ela realmente vai atrás e faz. Disse pra ela que sinto que Theatre consome todo o meu tempo e energia, senão estaria muito mais envolvida na escola. O que é totalmente verdade: até agora não consegui participar apropriadamente de nenhuma sessão da MUN (Modelo das Nações Unidas). Ao mesmo tempo, não me arrependo. E disse pra Bo que ajudarei ela com o que precisar. Temos planos pra melhorar nossas condições, pra melhorar a integração das moradoras (e dois moradores) do segundo andar de Musala e pra organizar melhor as coisas. Pensamos alto às vezes, mas gosto do otimismo das nossas palavras ditas.
Corri para Aleksa, meia hora atrasada, e tive 15 minutos de puro alívio por finalmente, depois de dois meses (literalmente), conseguir ouvir a voz querida da Flávia.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

adeus, verão prolongado

Sem mais delongas: depois desse verão estendido, estamos finalmente dizendo adeus aos dias ensolarados e secos; ao sol que bate no quarto #4 no segundo andar e que não me deixei dormir à tarde; ao suor resultante da caminhada até Susac; à vontade incontrolável de entrar no Neretva depois da aula e de tomar um sorvete em Old Town.
Hoje, quando minha rommie, Aisa, me contou que ia levar todas as roupas de verão pra Travnik, a cidade natal dela, durante o feriado da semana que vem, e trazer todas as roupas de inverno, eu me toquei: o inferno começa agora. Quem me conhece sabe o quanto eu detesto frio. O quanto eu odeio me mexer quando está frio e a minha vontade zero de sair debaixo da coberta de manhã. Sim, temos aquecedores aqui nos quartos e, graças a sei lá quem, o meu quarto é o quarto mais quente de toda Musala. Mas mesmo assim, venta muito no caminho pra escola e já sinto o friozinho vindo.
Não sou friorenta. Os europeus já começaram a usar casacos, mas eu continuo com as minhas camisetas de manga curta e meia-calças com shorts. Vai entender... Segundo o Bebo (Egito), egípcios e brasileiros tem sangue quente e por isso não sentem frio. O que não tem sentido nenhum, mas ok.
O verão em Mostar durou muito tempo e os locais dizem que isso não é normal. Estou tentando me preparar psicologicamente pro frio que me espera nesse outono e, depois, o frio do inverno quando eu voltar do meu verão de sol e praia no Brasil durante o Winter Break. Mas, acima de tudo, hoje estou me preparando pro frio de Sarajevo que vou ter que enfrentar amanhã, quarta e quinta.
A região da BiH onde fica Mostar é a única com esse clima louco. O centro do país e gelado e o norte... nem se fala.

Mostar parece estar vazia. Fui pra Susac com Andra hoje e encontrei somente 5 pessoas numa residência onde mais de 70 pessoas moram. Até Musala parece uma casa fantasma. Isso porque a grande maioria das pessoas já partiu para seus Project Weeks. Tirando o meu grupo e os três grupos que tem seus projetos acontecendo aqui em Mostar.
E esse vazio significa mais tempo com Toam. Estou forçando-a a estudar, já que os SATs estão se aproximando, assim como os exams de Biology e Math que são a razão para ela estar aqui. Ontem fomos assistir um filme no shopping: Taken 2. Foi extremamente divertido. Mas depois passamos horas em Jump Jump: ela estudando, eu skypando com a família reunida comemorando o aniversário do meu pai e com a querida Mari que está nos confins do norte dos EUA. Toam quis me matar depois de três horas ouvindo eu falando português. Disse que causei uma dor de cabeça péssima nela.

Hoje Toam veio me agradecer enormemente pela mudança que eu fiz no quarto dela. Ela tem um quarto só pra ela que estava muito mal organizando. A localização da cama, do armário, da escrivaninha... Tudo errado. Eu convenci ela que uma mudança faria muito bem e, na madrugada de sexta pra sábado, reorganizamos tudo. Estou descobrindo minhas habilidades de decoradora aqui. Mojmir (Eslováquia) veio me pedir pra colocar as fotos dele na parede, porque ele morre de inveja da minha parede.

domingo, 14 de outubro de 2012

impotência

Meu co-ano, Greg, que está Adriatic College, em Duino - Itália, andou compartilhando um vídeo no Facebook. Deixei ele aberto no meu computador durante toda a semana, esperando arranjar um tempinho para assisti-lo. Hoje, finalmente consegui sentar em Jump Jump e assistir com meus próprios olhos a incerteza e instabilidade do meu país.

Peguei-me com um sentimento absurdo de impotência e odiei estar longe e não poder fazer nada. Mas me dei conta de que não é só a distância. Sempre existe algo acima pra te parar. Lembrei imediatamente de um quadrinho que está na parede de Musala, quando subo para o meu quarto. O medo é sempre bom pra consolidar a democracia.
A política é odiada por Brasileiros, porque ela não funciona. Não importa se é ditadura, se é democracia: o ódio sempre existe. Políticos são porcos ladrões e ninguém quer realmente se envolver com eles. Só as companhias, porque, no final das contas, elas estão por trás de tudo.
E, uau, que ódio da impotência; que ódio da impossibilidade de mudar as coisas. Gente que desiste só porque, sei lá, parece que nada realmente ajuda. Os umbigos tornam-se cada vez maiores, porque olhar para fora, pro geral, e ver a dor, o medo, o perigo é horrível. Sempre é melhor chorar pelo frango do almoço ou pelo estudo excessivo do que tirar a bunda do sofá e fazer algo. Não sei que "algo" é esse. Realmente não sei, então não estou apontando dedos para ninguém. Mas sinto que o Brasil é cercado por medo, sempre encoberto por músicas maravilhosas sobre a beleza brasileira "Moro num país tropical abençoada por Deus e bonito por natureza; em Fevereiro tem Carnaval;". O Brasil fica embaixo de uma nuvem negra, não é mesmo? "Mas..." Mas nada. Não tem "mas", porque não adianta ver o lado positivo. Eu quero mudança social. Mais do que econômica, política ou cultural. Quero melhoria na educação, na saúde, nas condições do povo brasileiro.
E quando eu falo pros meus amigos no UWC que eu amo o Brasil, acho que não é verdade. Não amo o meu país. Amo a natureza, sim. Amo a cultura: na maior parte dos aspectos, excluindo o "jeitinho brasileiro". Mas não amo a entidade, porque o medo que consolida a democracia é sagaz. Tão sagaz quando unhas afiadas encravadas na pele.

"A pobreza gera capital. É uma fonte de riqueza. Mas não para quem é pobre."

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Shakespeare no porão

Quatro horas. Não são tique-taques, são olhares incessantes direcionados para o canto direito da tela do computador. O porão não os permite saber que horas são, ou se ainda há sol do lado de fora. Thou, ele grita. A voz profunda e sedutora. Outra calma, macia, quase sustentável no clima pesado e cansado. Ay, my lord. Alguns desesperados abrem a ferramenta de tradução de um site de pesquisa e digitam mecanicamente todas as milhões de palavras que não parecem ser em Inglês. Nay, nem mesmo o falante nativo consegue ler de forma apropriada. A diretora não consegue segurar o russo. O russo usa casaco, mas a brasileira não. Será frio? Uma pulseira do Bomfim cai depois de dois anos e o que resta é um pedaço de pano torcido e enfiado dentro de um bolso de uns jeans.
Uma mesa comprida, outra redonda. Cadeiras espalhadas ao redor, fios de carregadores esticados pela sala, tentando alcançar dois buraquinhos longínquos. Um pacote rasgado e murcho de deliciosas waffles de chocolate. Um cheiro liberado a cada meia hora que exala pelo cômodo e todos os olhares se voltam para o objeto quando o som soa. Uma garrafa vazia de Coca-Cola zero deitada sobre a mesa - tão cansada quanto os seres humanos na sala. Frustração. Confusão.
[falls and dies]
Apitos de computadores confusos - como o final de uma vida. Uma insistente fala e uma réplica um tanto quanto rude. Uma atmosfera pesada que sobrevoa cabeças e pensamentos. Querem fazer isso ou não? Nem sabem. Nem querem saber. Batatas-fritas que foram esperadas por quarenta e cinco minutos e que são deixadas sobre um prato deixado sobre a mesa. Errado, errado.
Foram tantos atrasos. Será que foi tão importante assim? E-mails impacientes e irritados “Deveria ter me avisado antes de ter ido”.
Mas Shakespeare não espera. Shakespeare não espera estudantes estudarem; não espera estudantes incomodados discutirem os problemas; não espera que consigam; não espera que façam isso direito. E dois atores não aparecem. Polonius e Rainha, onde vocês se esconderam? Talvez devam desistir. E são tantos projetos independentes que a diretora não pode depender dos atores.

hamlet, brigadeiro e project week

Uma manhã gelada em Mostar e uma câimbra insuportável na batata da perna me acordaram pra uma prova de Peace&Conflicts Studies. Digamos que não foi a melhor prova que eu já fiz (assim como ontem a de História também não foi) e depois capotei na mesa por uma hora esperando o resto terminar a prova.
A vida anda... cansativa. Ontem começamos com a maratona de teatro outra vez: 4 horas por dia. Lemos 70 páginas de Hamlet e foi insuportável. Nem mesmo o Spencer (EUA) consegue ler direito, imagina quem nem inglês bom tem! E a Snezjana quer muito que façamos essa maldita peça. Nem a Peya (Namibia), que é quem vai dirigir, quer fazer Hamlet. E, só pra constar, é o IPP (Independent Project - ninguém sabe me dizer o que é o outro "P") dela. Teoricamente, de acordo com o IB, o professor não pode interferir no IPP de um aluno, que é exatamente o que está acontecendo. Pra Peya é difícil, porque ela é um amor, atenciosa e paciente, não sei até que ponto ela vai aguentar dirigir, porque ela não vai conseguir mandar a gente calar a boca e focar. Mas eu sei que ela está se esforçando muito, como percebi quando dei uma folheada no Theatre Experiences dela. Mas enfim, de hoje até Sábado, continuaremos focando no texto, nos cortes de cena e de monólogos não tão importantes. Até porque não faremos o começo da peça.

Finalmente usei uma das 4 latas de leite condensado que meus pais trouxeram pra mim! Fiz brigadeiro e tive um momento delicioso com gostinho de casa no quarto de Peya (Namibia) e Natasa (BiH) com elas, Toam (Israel) e Bengisu (Turquia). Elas gostaram muito (não tanto quanto eu esperava, mas ok) e pra mim foi fantástico comer brigadeiro.
No entanto, foi bem tenso preparar o brigadeiro na cozinha, na frente de várias pessoas e depois sair correndo pro primeiro andar sem dar brigadeiro pra ninguém. Sejamos francos, se você der "um pouco" pra 74 pessoas, no final não sobra nada pra você. Mas eu prometi que depois do Bayram, farei brigadeiro pra geral, daí cada um experimenta um pouco.

Semana que vem: Project Week. Depois de uma frustração geral imensa por conta das propostas de Project Week e a falta de mobilização dos alunos (principalmente locais) pra organizar alguma coisa interessante, me inscrevi pro único Project Week que tinha sido organizando pela própria escola e não pelos alunos:  construir casas em Srebrenica, a cidade onde houve o massacre em 11 de julho de 1995 (é, Isa, seu aniversário) e que foi muito destruída pela guerra. O projeto era algo semelhante ao Teto, basicamente, e me animei bastante pra ir. Construir casas em favelas em São Paulo já é um aprendizado fantástico e uma vivência indescritível. Imagina construir casas numa cidade destruída na BiH? Fiquei absurdamente fascinada. Mas dois dias atrás, somente 15 pessoas receberam um e-mail, falando que estavam partindo pra Srebrenica na manhã seguinte. E a grading session? E os retakes pros segundos anos? Ah, e será que o próprio colégio se deu conta de que a data do Project Week é do dia 12 ao dia 20? Parece-me que não.
Fiquei irritada pela falta de organização e me dei conta (assim como umas outras 40 pessoas que tinham se inscrito pra esse projeto) de que acabaria indo pra um projeto qualquer. Mas a esperança surgiu quando Elisaveet (Grécia) me mandou um e-mail sugerindo que nos inscrevêssemos juntas para o projeto que a nossa segundo ano, Iva (BiH), havia organizado de última hora: uma parceria com um canal de TV chamado PinkTV para fazer uma reportagem sobre o UWCiM. Iríamos para o estúdio deles em Sarajevo, opinar e ajudá-los a editar o vídeo. Fiquei muito animada. E Iva acabou de vir falar comigo no Spanish Room, dizendo que o grupo é eu, ela, Andra (Kosovo), Elisaveet (Grécia), Pasha (Russia), Bebo (Egito) e Dado (EUA/BiH).

Joguei todo esse monte de informação sem explicar o que é Project Week... Basicamente, é um incentivo dos UWCs para que os alunos parem de só falar e falar e realmente façam alguma coisa pra ajudar a comunidade. Essa era a ideia inicial do UWC, mas, no final das contas, acabou virando uma semana em que um grupo de alunos pode fazer uma caminhada longa ou turismo em algum lugar com uma desculpa imbecil de conhecer a cultura (caso de alguns dos meus segundos anos que estão indo pra Istambul). Em alguns colégios, acontece duas vezes por ano, mas, no UWCiM, pela falta de grana, só damos conta de fazer uma vez por ano. E as opções são bem limitadas, porque eles só dão 50 euros pra cada aluno e digamos que a maioria dos projetos exigem mais do que isso. Aparentemente, ano passado, os alunos mandaram e-mails pra todas as companhias possíveis (estilo FUFEI) pra arranjar grana. Mas esse ano o colégio não autorizou que tivéssemos patrocínio, sei lá porquê.

domingo, 7 de outubro de 2012

o IB é real

Sabe, meus co-years tem reclamado muito do trabalho. Não sei porque, mas sinto que eu não tenho tanta lição quanto eles. Talvez por conta das minhas escolhas de matérias... Mas poucas pessoas se dão conta de que o IB e o UWC são muito mais do que sua predicted grades ou grading sessions.
Essa semana, é minha primeira grading session, o que significa que eu tenho provas de todas as matérias. Mas esses resultados são inciais e são +, / ou -, em vez de notas (1-7). Obviamente que a maior parte dos meus co-years estão surtando e reclamando por todos os cantos, enquanto os segundos anos tem milhares de IA's, HI's, WL, TOK essays...
Eu não estou surtando. Na verdade, não sinto que tivemos conteúdo o suficiente pra sentar e estudar por mais de uma hora. Mas o IB é real. O IB não é só um mito. E o que me fez perceber isso foi receber o e-mail do meu professor de Peace&Conflicts falando que essa semana teremos aulas de teatro. Como já expliquei aqui, a professora só vem pra Mostar uma vez por mês. A partir de terça-feira, voltarei da escola às 15h15 direto pra aula de teatro e só sairei do porão de Musala depois das 19h. Temos que começar a preparar Hamlet pro Winter Arts Festival... Não estou preocupada com o tempo pra estudar, porque eu só funciono pra estudar depois das 23h e isso é perfeito aqui. Mas a questão é que, na mesma terça-feira, eu tenho MUN às 15h30 e reunião do Student Council às 15h20. Pena que eu não sou onipresente, como diriam meus pais. Quero muito participar do Student Council, reclamar sobre a nossa nova regra de check-out e a estupidez dos donos de Susac e Musala, mas Theatre é uma matéria e eu não posso matar aulas...
O IB é exigente. Os CASes são exigentes (e muitas vezes emocionalmente complicados...). E eu sinto que o clima em Musala está ficando bem tenso. E mesmo eu não sendo uma pessoa tão preocupada com notas, parece-me que o clima vai me afetar de alguma forma.
Tem um expressão em árabe que diz "موي لصب مويو لسع" ou  "yawm basal wa yawm aaasal" em franco árabe. A mesma expressão em hebraico é ""yom asal yom basal"". "Um dia de cebola, um dia de mel". O que significa que você não pode ter dois dias de cebola seguidos.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

desastres naturais, fome e duas horas de paz

Uma semana que começou agitada. Aliás, foi a semana passada que terminou agitada: três terremotos durante a minha aula de História. Na verdade, foram vibrações da terra, mas eu realmente senti e foi como um choque adrenalina. Primeiro, ou melhor, três primeiros terremotos da minha vida!
A chuva de Mostar ameaçou começar. Aqui, quando começa a chover, chove praticamente sem parar por uns dois meses. No começo dessa semana, choveu bastante e todo mundo ficou com medo que não parasse. Mas o tempo abriu de novo e o calor infernal continua...
A terceira agitação (ou quinta) foi ser eleita membro do Student Council. Esse é composto por doze pessoas. Somente três mulheres. Sou a única mulher do primeiro ano, sendo que somos quatro primeiros anos. E das doze pessoas, três são alemãs. Coincidência que a Alemanha é tenha um poder absurdo na Europa e no mundo? Creio que não. E por acaso dois desses três alemães são os Student Representatives, que são os representantes de cada geração na Leadership Meeting, que é, basicamente, a reunião entre todos os professores e diretores da escola.

Meus pais foram embora na terça-feira de manhã, mas na segunda-feira tive a oportunidade de passear com eles e comer um pizza deliciosa em Rondo. Meus amigos ficaram muito feliz em conhecer meu pais e principalmente em poder conversar com eles, porque a maioria dos pais que vem aqui de visita não sabem falar inglês. Meus pais são figuras absurdamente simpáticas e óbvio que todos ficaram encantadíssimos com o jeito de falar e os sorrisos brasileiros. Pena que alguns amigos não tiveram a oportunidade de conhecê-los por estarem em Susac... Droga de distância entre as residências.

Hoje, Peya (Namibia) e Noga (Israel) mandaram um e-mail pra todo o colégio sobre o vídeo que elas fizeram pra um concurso chamado "30 seconds to end hunger" ("30 segundos pra acabar com a fome"). O vídeo delas ficou lindo, lindo, lindo! A narração foi feita pela Noga (dá pra ver claramente o quão bela a voz dela é... quando ela canta me dá arrepios) e garota que aparece nos últimos segundos do vídeo é a encantadora Peya. Não foram elas que editaram o vídeo, na verdade, foram dois caras locais que mandam muito. O vídeo ficou sensacional.


Essa noite, ninguém foi autorizado a sair da residência. Eu sai do Brasil achando que tinha me livrado da torcida Corintiana e foi só chegar aqui e descobrir que, quando tem jogo de futebol, é aconselhavel que ninguém saia. Isso porque o jogo de hoje foi entre times de diferentes etnias e você nunca sabe se alguma coisa vai acontecer... Antes que você entenda errado, isso não significa que vão jogar bombas por aí ou que vão atirar em alguém. Isso é a BiH quase vinte anos depois da guerra. Mas é estilo torcida de time grande quando perde (eu falei do Corinthians, mas era brincadeira, só pra esclarecer), saí por aí fazendo sei lá o quê.
Depois de um longo dia, resolvi fazer algo que eu não fazia a muito tempo: peguei o violão do Quinten (Holanda), minha pasta de música, a chave de Reetta (Finlândia) da sala de música e desci pro porão. Uau! Foram duas horas maravilhosas. Deixei o relógio no meu quarto exatamente pra não ver o tempo passar. Acho que eu nunca toquei violão com tanta paz como a que eu tive lá embaixo.
E agora estou no meu quarto, pela primeira vez em muito tempo (sem ser quando eu venho pra dormir, é óbvio). Nem Aisa nem Veronika estão aqui e acho que é a primeira vez que eu fico sozinha de verdade. Estou ouvindo Bob Marley e comendo uvas.

UPDATE 29.10: o vídeo ganhou a competição!!!